No dia estupidamente frio como que de Inverno…
adormeço quase a medo quando amanhece
porque há dias que nos amanhecem no olhar
ali, mesmo antes do sonho, de te sonhar
sinto o tudo que finjo, antes que sofra o que sinto…
se poeta fosse o que deveria ser?
e homem quem seria se o fosse?
deveria existir uma forma de encontrar as coisas
de lhe sentir o sentido, de as ver de fora
de olhar a tempestade a partir de dentro
como a totalidade do universo, não o infinito
mas esse conhecimento parcial da totalidade
como numa clareira, rodeado da floresta
mas reconhecemos a clareira na sua totalidade
reconhecemos a floresta, e a irracionalidade que a habita
mas como é que eu sei se teria sido feliz?
como é que eu sei qualquer coisa a respeito do que teria sido
do que teria sido, que é o que nunca foi?
e assim é tudo arrependimento,
e o arrependimento é pura abstracção.
dá um certo desconforto
mas também dá um certo sonho…
sonhar a possibilidade do que poderia ter sido
essa existência do tempo que foi sem o ser
poderia não ter casado, poderia não o ter escrito
poderia também nunca ter equacionado
ou duvidado do que foi concretizado
existem essa infinidade fria de ses, e se…
pelo menos é melhor pensar que é assim.
é um quadro de casa suburbana, alguém me espera
é uma boa paisagem íntima de cabelos castanhos
e os remorsos são sombras por detrás dos olhos azuis
em todo o caso, se assim é, fica um bocado de ciúme
se não tivesse percorrido o espaço do silencio
esse que mediava a não pergunta
e na não resposta afirmativamente positiva
“sim”…
mas o dia está frio, estupidamente como Inverno
e chego, como gelado, e adormeço a teu lado
ali, mesmo ali quando amanhece…
Alberto Cuddel
17/10/2020
03:22
Poética da demência assíncrona…
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