Uma carta ou apenas me confesso
– Sabes Maria, tenho pensado muito em nós, em mim contigo, quem serei eu livre do ontem, sem essa ancora que me arrasta, sem esse peso mórbido de um amor doentio, sem essas grades que ergui à minha volta, sem esta consciência velha amarrada a preceitos toscos.
– Sabes Maria, às vezes penso que morri, que estive morto demasiado tempo, que não vivi, agarrado a uma ilusão que não via, que representava a cada dia, como um animal adestrado num palco de circo, que servia o prepósito da aparência enquanto durava o espectáculo. Despois, morria de novo enjaulado até ao próximo, inventando Tiago em sonhos, poemas escritos e perdidos no tempo.
– Sabes Maria, ainda tenho medo da porta aberta, mas já tenho mais certezas que medo, já perdi o medo de sonhar, deixei de inventar nomes, de inventar personagens, eu sou, hoje olho-me e existo, sei-me onde não me sabia, preso ainda, mas já não tenho medo da posta aberta, começo a retirar a cada dia cada uma das barras erguidas!
– Sabes Maria, já não é o medo que me prende, já não é a consciência, mas essa liberdade que sonhei, não quero fugir do gradeamento pela calada da noite, não quero esgueirar-me por uma liberdade escondida, quero entrar no espectáculo, brilhar além do domador, e sair aplaudido pela porta de entrada.
– Sabes Maria, quero que me vejam, que me conheçam, como apenas tu me conheces, quero que me olhem além do cinza dos dias, quero pintar-me de arco-íris, e dizer estou vivo, encontrei-me onde antes estava morto, não sou sonho, sou o reflexo de tudo o que outros sonharam por mim. Eu sou Homem, Poeta, e sou FELIZ!
– E sabes Maria, não foste tu que me libertaste, mas escolhi-te para que me esperasses, nessa mão estendida que aguardava à porta!
Alberto Cuddel
C.R., Portugal
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