Ontem a véspera de hoje…
Não esperei o amanhã, nem tão pouco a saudade dos beijos que se perderam na vontade sem nuca terem sido saboreados pelos meus lábios, não, não esperei, sentei-me e parti dali sem rumo certo. Olhei-te ainda como numa despedida acenando lenços brancos enquanto o barco zarpava rumo a um planeta distante… tudo era tão certo e tão real, a vida era essa certeza inquieta de ser uma existência virtual da perseguição da vontade…
Olhei inquieto o espaço vazio entre mim e o querer sair dali as paredes de um âmbar fosco aprisionavam-me os sonhos, mas eu voava entre as ervas daninhas e o pouco milho que imaginava, não havia água, mas chovia no meu olhar… entre os girassóis atordoados por uma luminescência plena, sem vontade própria de seguir um rumo inexistente, apenas as caturras quebravam o silencio dos campos, não havia corujas, nem ratos, nem noite… tudo era cientificamente aborrecido…
Tive ideias de levantar-me e partir, mas o destino era em mim incógnita… para onde se nem na morte a certeza existe… saia dali, e ia… sem destino, sem rumo, sem futuro, sem metas ou objectivos, tudo estava ali pronto, bastava um pensamento, comia, na ilusão de ficar saciado, bebia… dormia, beijava-te até… nem tinha a possibilidade de sentir saudade, tudo era tecnologicamente satisfeito, todas as vontades, todos os desejos… como sentia falta de ontem, desse tempo em que corria atras de tudo, que tinha sonhos reais, desses que nunca são realizados…
E ontem era tão somente a véspera de hoje, de um tempo sem futuro e sem desejo… resta-me um, morrer… e o hoje que nos proporciona a vida não permite…
António Alberto Teixeira Sousa
In: Sonho perigoso de um futuro que pode acabar…

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