Sinal de partida.
Tinham passado pouco mais de cinco horas, desde o “sim”, um sim definitivo, mas com todas as fotos e festa ainda não tinha tido tempo para pensar, “até que a morte os separe”, essa definição agora assusta-me.
Aqui agora à espera, nesta sala, não consigo estar sentado, as paredes parecem-me anos, enclausurado por estes azulejos antigos de arremate verde, iremos terminar assim? Aparentemente gastos e desgastados? Tenho dificuldade em olhar-te, mesmo assim, o olhar não foge desse teu ar inocente e incrédulo, sentada nesse banco desta velha estação enquanto esperamos o resto da nossa vida.
Finalmente és minha, e agora? Como fomos capazes deste passo sem pensar o amanhã? Talvez o tivéssemos pensado até demais, não como sonho, mas com a maturidade que ainda não temos…
– Ainda demora muito?
– Não, julgo que não, mais uns dez minutos.
– Porque não te sentas? Estás nervoso? Eu é que devia estar, o normal seria eu estar, não tu.
– Tens razão. Mas não é “esse” o nervosismo, sabes bem que não é por isso. Apesar de tudo nesse aspecto temos um mundo a descobrir e todo o tempo do mundo para o fazer.
– Então? Que se passa?
– Estás ciente do que temos aí nessa mala?
– Ah, isso, realmente tens razão, mas acho que estas a desculpar-te, tens algo mais a preocupar-te, já te conheço.
Realmente, não era apenas isso, o dinheiro que os convidados tinham dado como prenda, ou nem sequer era isso, era tudo, não se casa todos os dias, e agora? Eu que nunca fui responsável por ninguém, a partir de hoje tenho alguém que efectivamente e afectivamente depende de mim. Tinha sido fácil o ter dado o passo seguinte, o ter avançado para o pedido de casamento, todos os planos durante o noivado, mas agora, a vida começava efectivamente e sem rede.
– Júlia.
– Sim.
– Tens razão, estou nervoso, toda a nossa vida começa hoje, e não posso deixar de ter medo.
– Eu sei, mas nunca te esqueças, eu também disse sim livremente, e estarei sempre ao teu lado, em tudo.
– Sim, claro que sim, mas tenho um friozinho no estômago, tenho medo de te desiludir.
– Ainda bem que o tens, mas como sempre fizemos, tudo podemos um com o outro, em todas as nossas decisões. Não tenhas medo, basta que nos amemos, eduquemos mutuamente…
Um silvo, o comboio aproxima-se e começa a viagem do resto da nossa vida, com paragens e avanços, até que um de nós se apeie, por um qualquer imprevisto da vida!
Alberto Cuddel
14/06/2017
Foto de Antonio Mbfeijó
Gostar disto:
Gosto Carregando...
Comentários Recentes