Poema chocado…

Poema chocado…

há mansidão nesses poemas que eclodem
que mastigados fermentam no amago
depois do silêncio alguém os pare
por entrem obstetras ausentes, – chegou a hora – e nascem…

totalmente indiferentes aos obuses e metralhadoras que disparam
indiferentes aos homens que se matam e matam os outros…

agita-se o ninho… forra-se a toca… e nascem
alimentando-se dos olhares inconformados
que quem os lê, e quem sabe também os mastiga…

Alberto Sousa
07-07-2022
Poemas de nada que se perdem na calçada

A noite que me abrace por dentro

A noite que nos abrace por dentro

Há nessa escuridão que nos abraça um conforto capaz, um abraço quente em nós mesmos, esse abrigo do vento das palavras vãs, esse crer absoluto de que nós somos, e somos apenas em nós, que que outra alma possua luz ou calor que nos reconforte… há momentos na vida em que abrimos portas, e por mais negro que seja o interior dessa sala entramos, por estar cansados, por estar fartos da luz, da existência, apenas procuramos o silêncio, a imobilidade, o ficar ali, enrostados num canto, sem absolutamente um som, uma gota, sem a distracção das sombras, do movimento… queremos apenas que tudo desapareça, absolutamente tudo… que não exista mais nada para além disto… eu quero apenas que o silêncio me preencha, que a escuridão me conforte… que nada mais exista…

António Alberto Teixeira de Sousa

De mim

De mim

Desfolhou-se a tarde no meu olhar
Inverneira, cinzenta, suicida paixão
O sol que me acalentava do coração
Havia morrido ali, bem longe de ti!

No teu amar não existo, apenas existes em mim
Não te compadeças das quimeras, apenas por fim
Dos beijos que morreram no desejo dos teus lábios
Olha as estrelas, videntes, cartomantes e sábios
De mim, tudo na transparência certa do ser pleno
Perguntas e certezas inscritas na perpétua areia
Lavradas e gravadas em ondas de um mar sereno
No brilho do orvalho matutino, noite de lua cheia!

Encontrei-me ao amar-te,
No espelho dos dias, vejo-te,
Não me encontro, ali, na solidão,
Para me ver, olho-te no doce olhar,
E nesse mar, onde habita a paixão,
Encontro-me, descobrindo o ato de amar!

Alberto Cuddel®

Paixão ao luar

Paixão ao luar

“Despertar o brilhante
Que vive no céu estrelado
É como uma estrela cintilante
Num coração amado”

Ana Margarida de Assis

Por entre horas desfilando em arco
Nas horas que contem a madrugada
Nascem gemidos
Beijos nas pontas dos dedos
Corpos que se enrolam na areia molhada!

Abraças o mundo, abraças-me
Sentir dormente, movimente das ondas
Estrelas reflectidas no mar do teu olhar
O rubro do rosto, iluminado pelo luar,
Salgado beijo onde deliro…

Consome do desejo de não tocar
Toda a plenitude do corpo e amar
O coração que acelera ofegante
Pela saudade de um tempo em nós distante,
Encontros sem tempo, sós
Na nossa solidão sem gente…

Noites, luar madrugador,
Areia quente, amor
Molhado, lavado
Gemido, beijado
Abraçado, movimentado
Num praia,
Que as marés do tempo
Não apagam,
Não acalmam,
O que o coração sente
Ou o corpo desejo ardente!

O sol espreita o horizonte
Iluminado teu rosto
Novo dia, que se aponte
Amar não é em mim pressuposto
É apenas a força do meu viver!

Alberto Cuddel
06/07/2016

A colecção de abraços que nunca se deram…

A colecção de abraços que nunca se deram…

a brisa incerta da tarde me traz à fronte e à compreensão
a carência atroz do tempo que não findou
e a caderneta vazia, sem cromos ou memória…
Sei só que o tédio que sofro se me ajusta melhor,
um momento, como uma veste que continua a roçar numa chaga
a dor amenizada pelos beijos, não morre pela carência do receber…

há um abraço por entregar…
e nasceu o sol, e veio a manhã, depois a tarde e nem à noite…
há uma clareira aberta, onde cantam os pássaros
um lenhador solitário, casas de chocolate…
flores que irão florir e ninhos de ovos férteis
uma monotonia no ruido dos bichos…
e somos bichos,
– sou bicho…
como a carência dos bichos e fome de Primavera

tudo quanto amamos ou perdemos — coisas, seres, significações
e tudo o que nos roça a pele e assim nos chega à alma,
e o episódio não é, em Deus, mais que a brisa
mais que um leve roçar de sol na face…
e nada me faz salvo no alívio suposto,
o momento propício – um abraço com poder de beijo
um beijo com fome de prazer
e o poder perder tudo espontaneamente…

e uma colecção de abraços vazia…
com fome de vida…

Alberto Cuddel
09/08/2020
05:40

Poética da demência assíncrona…

Canção de país longínquo

Canção de país longínquo

“cantava, em uma voz muito suave,
uma canção de país longínquo.
a música tornava familiares as palavras incógnitas.
parecia o fado para a alma,
mas não tinha com ele semelhança alguma.”
Bernardo Soares

uma canção, um eco lamurioso
um país distante, ali, mesmo ali, à distância de uma porta
à distância de um abraço, nessa incógnita final
nada é, para protecção de todos…
parecia o fado para a alma, esse sofrer de vitória
entre derrotas individuais, sem esperança no amanhã
a nação erguida pela vitoria colectiva…
o ruído da cidade não se ouvia
não se escutava, apenas se sentia
um murmúrio, “vai ficar tudo bem”
e o bem não é de ninguém…
gemem a reclusão do tempo
para protecção da vida
que corre na esperança
de quem trabalha
e caminha pelas ruas vazias…
amanhã erguer-se-á a voz
em novos fados, canção de país longínquo
à distancia de uma porta, de um abraço…

Alberto Cuddel
25/03/2020
03:03
In: Nova poesia de um poeta velho

Imensidão da noite

Imensidão da noite

“É tamanha a noite que me sobra nos braços”
Florbela Lourenço

sobra-me a esperança da solidão que engulo
essa que se crava nos dedos como memória
esse orgulho falacioso e desprezivelmente vil
ser… sem estar… mas ser, tristemente é…

as noites desenrolam-se
como sombras desordenadas no tecto frio,
os lençóis dormem amarrotados e gélidos,
vazios de corpo, de gente, de nós…
os minutos desfilam como cordeiros
compassados, ordenados, mecânicos
o tempo é o que sempre foi…
uma tortura medível pela ausência
a solidão vem-me trazida pelo som
esse som do mundo em ranger de madeira
sobram-me os braços vazios
sobram-me as noites,
sobra-me a vida
sobra-me o dia e o sol…
sobro-me a mim por não me bastar…

Alberto Cuddel
05-03-2020
16:30
In: Nova poesia de um poeta velho

No abraço que nos ampara

No abraço que nos ampara

dorme sobre o meu abraço
sonhando um novo sonhar
no meu leito do cansaço,
novo dia iremos alcançar!

pudessem todas as noites ser a novidade da vida,
serem o descanso e cansaço que se nos prometia,
ser o leito o porto de chegada, o dia ponto de partida,
pudesse a alma revigorar-se, abstinência que já sentia…

ó alma doce que me ampara
nesse olhar de mel que me conforta
sejam as estrelas testemunhas
e a lua confidente,
seremos seres, seremos gente?
leito despido das noites
vazio dos dias que adormecem…
sem esse abraço que nos ampara…

Alberto Cuddel
28/02/2020
17:30
In: Nova poesia de um poeta velho

A corrupção de um abraço vazio ou a falta de um beijo

A corrupção de um abraço vazio ou a falta de um beijo

Sejam os abraços cruzamentos
Batimentos musculares que se complementam
Sejam peitos abertos à corrupção da palavra
Apertem-se pela erosão do vento
Brisas da revolta em pensamento fechado…

Gravem-se em pedra as pegadas dadas
Em passos no mesmo sentido
Movam-se as areias e as folhas
Sequem as almas chorosas no beijo
Partam de mão dada – vida…

Humedeçam os lábios
Profiram construções
Enlaces, uniões
Cravem os dentes na discórdia
Abracem a maré que nos arrasta…

Olhem o horizonte
Procurem-se lá…
Não no asfalto negro atrás de vós
Não nas pegadas na areia
Não na solidão de um abraço vazio
Mas lá, lá longe onde desejam estar…
Na corrupção do passado
Apenas vive água e cloreto de sódio
Um rosto triste e um corpo vazio e amargurado…
As árvores morrem de pé, por não poderem partir…

Alberto Cuddel
24/01/2019
17:55
#osuaveaconchegodopoema

Nesse abraço…

Nesse abraço…

Nesse abraço cabe tudo
O calor, o medo, o amor
A segurança, a confiança e o perdão
Nesse abraço cabe o mundo
Cabe o meu coração e o teu…

Nesse abraço cabe o mar
O céu, a terra, o meu e o teu
Cabe a vida, o ontem, o hoje
Cabe até o amanhã sonhado…

Nesse abraço, cabemos nós
Na convicção que entre os nossos braços
Vivemos… mesmo que nada mais importe
É nos meus braços que te quero
Que te encontro, que te espero
Como quem segura o tempo
Que tantas vezes se perdeu
Por entre os dedos abertos…

Nesse abraço com que te quero abraçar…

Alberto Cuddel
12/01/2018

Cais…

Cais…

Há almas esquecidas no cais
Na ausência de um abraço
Perdidas sem um “onde vais?”
Sem um acolhimento no regaço!

Há corpos sem um porto de abrigo, nessa solidão assim comprometido, sem esperança, sem leve à deriva, sem uma brisa que lhe lhes aconchegue a alma!

Há gente perdida, sem um abraço, sem vida, há gente tão diferente, sem esperança e sem saída…

Há almas esquecidas no cais
Na ausência de um abraço
Perdidas sem “um onde vais?”
Sem um acolhimento no regaço!

A ti, que me acolhes, que me guardas e me guias, que te aninhas no meu peito, sem medo das noites e dos dias, a ti que és meu cais, meu porto de abrigo, dona dos meus ais, a ti, a ti mesma, eu digo, és dona do resto da minha vida!

Há almas esquecidas no cais
Na ausência de um abraço
Perdidas sem um “onde vais?”
Sem um acolhimento no regaço!

Alberto Cuddel
01/10/2018
Castanheira do Ribatejo, Portugal

Poema do dia 17/09/2018

Poema do dia 17/09/2018

Abraça-me, como um primeiro e um último e todos os que virão depois!

Abraça-me a alma e os beijos,
Abraça-me neste adormecer de sonhos,
Abraça-me neste acordar de desejos,
Abraça-me antes de tudo, depois de nada!

Abraça-me e ama-me, assim sem qualquer razão
Ama-me longe, mas também perto,
Ama-me entre um vale e a serra,
Entre a praia e a maré….
Abraça-me até por uma questão de fé!

Abraça-me, como um primeiro e um último e todos os que virão depois!

Abraça-me mo medo, na insegurança,
Abraça-me na tempestade e na bonança,
Abraço-te entre um beijo e o depois
Nessa arte única de um batimento a dois!

Ama-me, na exacta media com que me amas,
Nessa forma tão própria de seres, simplesmente,
E abraça-me de novo, novamente, antes da gente
Depois do mundo, onde já ninguém em nós acredita,
Ama-me e abraça-me apenas para que eu me sinta!

Abraça-me, como um primeiro e um último e todos os que virão depois!

Alberto Cuddel
17/09/2018
Castanheira do Ribatejo, Portugal

Poema do dia 08/06/2018

Poema do dia 08/06/2018

Sabes, chove lá fora!

Sabes, chove lá fora, apenas lá fora, aqui não, não no reflexo de uma alma cansada, não no teu olhar… mas chove lá fora, nem me incomoda o som da gotas que morrem contra a vidraça, sinto apenas o aconchego quente do teu abraço, nos braços que me ladeiam, na forma elegante com que te aninhas em mim. No carinho absoluto de apenas ficar, sem mais, sem uma palavra, apenas no silêncio de estar um com o outro!
As horas jamais passam por nós, apenas estamos ali, naquele doce momento em que chove lá fora, e o frio esse não mora no calor das nossas almas, o frio é apenas a saudade de ontem, quando os nossos corpos não se conheciam, na intimidade do abraço, por que as almas essas, há muito que se pertencem…

Alberto Cuddel
08/06/2018
15:30
 

Poema do dia 22/05/2018

Poema do dia 22/05/2018

Perdi-me entre um abraço da alma
Com outro coração em meu peito
Braços apertando poemas, letras
Ser amigo que amo e em mim aceito!

Abraçamos causas,

virtudes, tristezas,

amores, matamos saudades no abraço,

abraçamos sonhos, desejos,

esperanças, alegrias, amores, dores…

Tudo nos cabe nos braços,
Tudo apertamos em laços,
Nos braços que se cruzam
Há dois corações que se usam…

Alberto Cuddel
22/05/2018
22:30

Num abraço…

Num abraço…

No espaço vazio entre os corpos
Cabem todos os medos e segredos
Não memória desse abraço desejado
Cabe toda a solidão e saudade
Cabe a vida, o amor e a simplicidade…

Nos teus braços que me abraçam os sonhos
Onde me moram os desejos de me fazer
Novamente vivo, novamente existo
No tudo que escondo de mim, mundos…

Num abraço de braços e letras que se lêem
Encontramo-nos nas páginas brancas
Sem espaço entre nós…

Alberto Cuddel
30/03/2018

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