Esqueci-me de te contar…

Esqueci-me de te contar…

Tingi de saudade os búzios do areal
O murmúrio das ondas do mar
O sal dos teus lábios…

Nos passos gravados ao luar
Poças de lagrimas…
Algas, escorridos cabelos…
Dores esquecidas nas rochas
Um peito inflamado
Na dor do passado…

Água nos pés,
Lavando a alma
Um corpo que se afasta
Vida que se extingue
Na visão aguada das estrelas…

Esqueci-me de te contar…
Que regressei onde queria estar…

Alberto Cuddel
11/09/2017
21:30

Despi-me do arco-íris

Despi-me do arco-íris

Fechei os olhos e olhei-me

Caneta sem tinta gasta,

Desgastada pelos dias, pelas noites

Deixei caída no chão a pele de cordeiro

Cacei como quem caça…

Eu e todos os outros de mim

Eu e todos os outros comigo…

Pacto…

Quando chegarem as noites

Depois que foram manhãs

Tardes sei lá…

Perceberás… que nada

Absolutamente nada

Valeu a pena…

A mortandade que se anuncia

Nada é… nada será…

Perante o negro silêncio…

Alberto Cuddel

11/09/2017

17:30

Da sala à cama…

Da sala à cama…

Por entre solidões cheias de sonhos

Desejos arrastados pelo soalho

Estercos das horas que não se apagam

Um leito meio vazio de nadas…

O amor não se compadece

Nunca se compadeceu das ausências

Provocação de vitrinas rubras

Um punhado de moedas de prata

Gemes contra a parede da sala

Pecados arrastados na rua

Uma mala cheia, prazer cheio de nada…

Sonho, acordado por beirais que pingam

No acordar do mundo, já havia chegado

No ar? Cheiro podre de álcool e sexo…

Um monte de trapos caídos da varanda…

Da noite, resta uma vida de inferno…

Alberto Cuddel

06/09/17

03:25

Por entre mentas e canela

Por entre mentas e canela

No roçar de lábios hálito fresco
Maresias enroladas em paus de canela
Ninhos redondos na palma da mão
Vínculos secretos por entre matas de amor
Humidade que te escorre da nascente…

Verbos gemidos contra paredes
Vaso hirtos em folhas de menta
Haste que te cresce nas mãos
Senhora minha de voz puríssima
Gemei baixinho ao meu ouvido
Lábios trémulos garganta cheia
Embriagues do sonho, erguido
Rosto que se prostra aos céus
Grito aprisionado nos lábios cerrados…

Por Deus caído no teu colo
Por hoje adormeceu…

Alberto Cuddel
06/09/2017
03:12

Poema VI

Poema VI

Onde te amei ontem?
Num poema sem versos
Nas lágrimas caídas no peito
Sussurro gravado ao ouvido
Mãos estendidas ao vento?

Onde te amei ontem?
Palavras esquecidas
Repetidas e gastas
Perdidas nas valetas
Debaixo das pontes
Nas filas dos transportes?

Onde te amei ontem?
Onde te escrevi?
Onde?
Se de ontem esqueci…
Nas palavras caladas
Nas rimas emprenhadas
Nas frases rebuscadas…

Onde te amei ontem?
Terá sido lá?
Onde perdemos o tempo?
Onde nos encontramos
Apenas num abraço?
Terá sido lá?
Onde ontem te amei calado…

Alberto Cuddel
19/09/2017
03:00

Seguiremos Maria

Seguiremos Maria

Nos dias quentes que percorremos
 – Vive comigo o Verão
Doce sabor maduro depois da Primavera
 – Mesmo nela choveu…

Vivamos o Verão enquanto estamos maduros
 – Que doces somos Maria

O Outono nos espera e aguarda,
O Inverno uma inevitabilidade
 – Enrosca-te em mim Maria
Definharemos juntos, quentes…
Até que o gelo nos leve…

Alberto Cuddel
14/08/2017
22:30

Poema XXXVII

Poema XXXVII

Eutanásia do Poeta
Assistiram-me no suicido
Cortaram-me a vida
As rimas, os versos
Fecharam os olhos de quem lê
O poema não vive de tinta
Mas de olhares inquisitivos
De olhares perplexos
De olhares contemplativos
De olhos que sentem…

Fecharam a porta, a janela
As capas, as vitrinas
Enclausuraram os versos…

Castraram-me a vontade
A crença, a saudade
Deambulo solto por palavras tristes
Punhos revoltados em riste
Corpos denunciados sem pudor
Arrastando na lama um pobre ego
Que ontem, apenas ontem
Ousou sonhar a poesia…

Hoje, arrasto o corpo carbónico
Por ruas estreitas e páginas vazias
Mãos tremulas que não escrevem
Sob um olhar alagado…

Alberto e os outros…
14/10/2017
20:01

Ida ao mercado

Ida ao mercado

Seguia rua abaixo
Saia rodada, passos firmes
Na mão um ramo de salsa
Na outra, carteira rota
Porte firme e altivo
Decote pronunciado
Busto proeminente
Redondo e firme…

Assobios e piropos
Moça roliça assim
Mão me cabe a mim…

Detém-se
Aninha-se
Apanha um papel
Um recado?
Uma conta?
Uma notícia?
Apenas um poema de ninguém…
A moça lê
E suspira
Por alguém…
Apenas um poema…
Um mero poema…

Alberto Cuddel
09/09/2017
13:10

Não sei como viver os dias em que sobrevivo

Não sei como viver os dias em que sobrevivo

Não sei como viver os dias em que não escrevo
Escrevendo silêncios…

Mastigo melodias em harpas desafinadas
Sem qualquer corda…

Danço, sentado à secretaria numa cadeira vazia
Escrevendo sebentas já escritas…

Ainda assim
Existem tantos dias em que sobrevivo
Ao poder consumista da poética…

Alberto Cuddel
04/08/2017
15:20

Asas

Asas

Há um pássaro livre que me povoa os dias
Sobrevoa-me e faz-me sonhar
Mas indigno quedo-me preso na consciência
Esse pássaro… essas asas… são apenas desejo…

No rasto do beijo que o sódio me deixa
Escorrem-me maresias pelas faces
Nos lábios esboço um sorriso
E sigo,
Sem sonhos
No impossível que são os meus passos…

Há um pássaro livre
Que me voa fora do peito
Apenas uso o sonho das suas penas
Gravando a fogo letras que povoam ilusões…
Morrendo a cada madrugada
Consumindo-se em cada verso
Renascendo a cada novo poema…

Alberto Cuddel
03/08/2017
19:45

Foi apenas amor

Foi apenas amor

Foram pétalas que te morreram nos lábios
Prazer que se extinguiu no abraço…

Palavras que se sufocaram nas lágrimas
Perdão que se arrastou pelas noites…

Nas chaves que nas tuas mãos morreram
A minha alma por quase nada…

A vida que tive, não foi muito
Foi apenas amor…

Alberto Cuddel
02/08/2017
20:50

Enchi os sonhos de vãs esperanças e acreditei no amor

Enchi os sonhos de vãs esperanças e acreditei no amor

Nunca medi o amor pelos orgasmos que senti
Apenas pelos que dei…
O tamanho do amor encontra-se na mão estendida
Mas nunca na vazia, na que dá…

O amor pavoneia-se nas sombras
Junto a uma multidão de cegos
Veste-se de graça despojando-se…

Abstive-me do sono
Pela fé no palpável sentir
O amor entrega-se de mãos cheias
Mede-se pelo olhar de quem o recebe…

Hoje cansado adormeci
Enchi os sonhos de vãs esperanças
E acreditei no amor…

Alberto Cuddel
31/07/2017
03:35

És em mim a tal mulher

És em mim a tal mulher

Encontro no brilho do teu olhar
Na firmeza dos teus seios, o desejo
A saudade diária do beijo, o amor…

Louco seja na vontade de me encontrar
Penetrando velozmente em teu pensar
Que sejam nos dias, nas duras horas aflitas
Doce cuidado onde me deito a teu lado…

Regatos de águas doces e frescas
Alimentadas flores e lençóis de linho
Pressas e trabalhos por entre cestas
Passarinhos dormem ainda no ninho!

Nas pernas torneadas que te sutem
Encontro a doçura do amor à vida
Consumado acto que me fez partida!

Alberto Cuddel
28/07/2017
02:04

Renasço a cada dia…

Renasço a cada dia…

Renasço do teu ciúme
Proclamado nos silêncios
No olhar reprovador
Ainda que não o digas…

Corto soalhos transmontanos
Por entre dizeres mundanos
Provocando o fogo do teu olhar,
Apenas para que me possas perdoar!

Renasço a cada dia
No cantar de uma cigarra
Mentia, mentia…
Para apenas ver a tua garra!

Renasço do ciúme,
Porque só tem ciúme quem ama!

Alberto Cuddel
03/09/2017
19:30

Amputação

Amputação

Perderei os dedos
A caneta das mãos
As palavras da boca
O sentir do coração

Amputado
Sem vontade
Sem querer
Sem viver
Abdico de mim
Do mundo
Sobrevivendo
Aos dias
Às semanas
Aos meses
Aos anos…

Arrumo as botas
No canto escuro
De uma prateleira
Onde mora
O ontem e a memória…

Porque amanhã
Amanhã serei
Apenas uma sombra
Do que já fui
Sem qualquer esperança…

Sem um adeus
Amputo-me
De mim mesmo
Para que sobreviva
Aos dias
Sem medo…

Alberto Cuddel
30/08/2017
23:00

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