Teia de arame, ou a ratoeira das moscas
Bailam borboletas pretas em estômagos vazios
Há uma febre baça, que pelo olhar nos passa
Correm os finados em direcção à terra barrenta
E há barcos encalhados no caís…
Tia Maria, você sabia? Claro que sabia…:
A filha da padeira, sobrinha do picheleiro
A neta da florista, irmã da modista
A que se metia com o taxista
Que namora com o engenheiro
Enrabichada pelo empregado da retrosaria…
Está de esperanças…
E todos esperam que o pai se apresente
Contando que com todos os que ela se deitou
Apenas o gay da esquina se manifestou…
-não é meu, mas poderei cria-lo com muito amor e carinho…
Olha os perigos,
de se sentar no comboio antes dos outros se levantarem…mas não sabe da melhor, o outro que era ladrão, o que batia na mulher, o aldrabão que vendia alpista… esse que desviou o barco na ribeira, está preso…
-preso vizinha? Era tão bom homem, ainda noutro dia enquanto o meu Manel trabalhava ele me fez a manutenção da canalização, e quase de borla….
-preso sim senhora, que eu vi, não é que o meliante, partiu um vidro de uma casa devoluta, onde vai parar este mundo com atitude semelhante…
Bailam ditados e ditos em cabelos arranjados
Há mascaras que protegem e tecem outras vidas
Palavras desmedidas por cameras de vigilância
Mais um doente, deve ser coração já la vem a ambulância…
Correm os finados, sobreviventes do dia…
do acidente sempre se salvam os defuntos…
Alberto Cuddel
01/10/2020
03:30
Poética da demência assíncrona…
Muito bom. Prosa poética recheada de filosofia.
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“Do acidente sempre se salvam os defuntos…”
Verdade sábia e intransponível .
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Grato Rinaldo
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